sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

A literatura é linguagem: ponto final.

João Tordo diz da melhor forma descritível aquilo que sinto em relação aos livros de José Rodrigues dos Santos:

A divisão entre os que "trabalham a linguagem" e os que "contam histórias" é a ideia mais absurda que pode existir em literatura. A literatura é linguagem: ponto final. É forma de contar, é "maneira" de dizer, é a construção de uma voz inequívoca que conta e que diz; aí reside a originalidade de um escritor e a sua arte. Qualquer pessoa pode "contar uma história" - o meu vizinho, o senhor do café, a minha avó...  Por outro lado, são em muito menor número os que sabem (e podem) escrever literariamente. Miguel Real escreve (e bem): "Eis porque a obra de JRS é academicamente mal vista: nada de novo traz à categoria de personagem, nada de novo traz à categoria de acção, de enredo, de tempo, de forma estética". 
Contar uma história não tem nada a ver com literatura: todos o fazemos, todos os dias, a todas as horas. "Contar bem" uma história, como reivindica JRS, continua a não ter nada a ver com literatura. Qualquer filme menor americano conta razoavelmente bem uma história. A literatura não pode ser polarizada desta maneira porque acontece-lhe uma coisa curiosa: deixa de o ser. Trabalhar a linguagem é o dever de qualquer escritor - ou, pelo menos, o de qualquer escritor cuja existência e essência se confundam, isto é, aquele que procura, com os livros que escreve, abrir uma brecha no muro de pedra em que a realidade se constitui; essa linguagem - ou essa voz, ou essa forma - constituem, por si só, a história de um livro. Isto é: um romance é a forma de contar um romance; a voz que se constrói com as palavras. E esta polarização do absurdo é muito cansativa.

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