segunda-feira, 6 de maio de 2013

Académica: o clube e o tempo

O texto é de Luis Freitas Lobo e reflete bem o sentimento que me toca face a este mítico clube e, acredito, aos mais aficionados, como o meu caro amigo Ruben Almeida.


"Pelas tribunas dos Estádios, durante a espera antes de um jogo, o momento que respiro melhor é quando descubro figuras de outras eras do nosso futebol. Nesse mundo, o melhor momento da época foi quando, nas bancadas de Coimbra, descobri o Sr. Francisco Andrade. Num ápice senti a atmosfera do velho Calhabé. Na minha frente, o homem que em 1969, com apenas 30 anos, dirigiu a Académica na mais mítica Final da Taça de todos os tempos, a tal em que o futebol fintou o regime.

No seu livro que me ofereceu e aconselho, Encontros e Desencontros, estão algumas delas (para além de actuais reflexões sobre o jogo). Como a forma como explicava a defesa à zona recorrendo à «Teoria dos quintais de Caiado»: "dividia o rectângulo de jogo em quadrados diferentes e dizia aos jogadores que eram quintais pertença da família/equipa, sendo cada um responsável pela sua guarda. Sempre que um fosse assaltado por mais que um assaltante, o vizinho tinha de o ajudar, e este recebia ajuda do outro vizinho mais próximo, e assim sucessivamente?". E fala no que é jogar bem e correr muito, com termos como transições, linhas e modelo.




As capas negras que 43 anos depois vão reentrar no Jamor são muito diferentes das de 69. Mentalidade, origem e jogo. Nem podia ser de outra forma. O romantismo do jogador-estudante é um livro fechado. Os tempos mudam, sem dúvida, mas sempre que visito Coimbra sinto dificuldade em perceber como se perdeu tanto essa ligação emocional profunda cidade-clube. Falam-me em muitos motivos. Vagos (novos tempos, a cidade mudou) e concretos (o Presidente, gestões dos últimos anos). Não sei. Sinto que é tudo uma questão de adaptação às realidades.
Todos vivemos com o passado. Mas ninguém vive do passado. O segredo dos grandes clubes é a capacidade de se reinventarem sem perder a identidade que os fez grandes. Penso que a Académica a dado momento não soube fazer isso. Agarrou-se demasiado ao tempo a preto-e-branco, quando devia ter pegado no mesmo património e meter-lhe as cores do presente (na gestão futebolística, social, marketing, etc). Para muitos «notáveis», dizer que são da Académica é quase um «acto de cultura». Dão opinião nos jornais se o clube ganhar ou entrar em crise. No resto, não existem.

A Académica embalada no berço por «Mestre Cândido» é a história com calções e chuteiras mais bem contada e fiel do nosso país futebolístico/social. O som das guitarras que continua a ouvir-se quando a equipa entra em campo faz cada vez menos sentido, mas a raiz do futebol da escola coimbrã, no estilo e táctica, é cada vez mais actual. Falar com Francisco Andrade devolve-nos àquela Académica que ainda faz arrepiar, porque "necessário é que os jogadores da mesma equipa, a defender e a atacar, pensem da mesma maneira". Também o futebol é feito de «encontros e desencontros». Mas hoje, sinceramente, acho que mais de «desencontros». Sinais dos tempos."

(http://www.planetadofutebol.com/artigos/o-clube-e-o-tempo)




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